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Um ano depois de registro do primeiro caso de covid-19, Brasil perdeu o equivalente à população
Quinta, 25 de Fevereiro de 2021 às 08:31
Doze meses depois do registro do primeiro caso da covid-19, o Brasil chega, nesta quinta-feira (25), à marca de 250 mil mortos e vive a pior fase da doença, com pico de internações e com ritmo lento de vacinação. Para tentar frear o vírus, prefeitos e governadores voltaram a adotar restrições rígidas. Especialistas afirmam que ainda não há controle sobre a pandemia.
Até as 18h desta quarta-feira, foram registradas 250.036 mortes, conforme levantamento feito pelo consórcio de imprensa junto às secretarias estaduais de saúde. Já segundo o painel de dados do Ministério da Saúde, são 249.957 mortes. Só nas últimas 24 horas, foram 1.428 mortos. E o total de vítimas da pandemia no Brasil pode ser ainda maior, considerando a subnotificação e outros óbitos que ainda aguardam confirmação dos testes para a covid-19. Desde que ocorreu a primeira morte pela doença, o país perdeu o equivalente às populações da cidade de Marília (SP) ou de Novo Hamburgo (RS).

O Brasil vive o pior momento da pandemia. Desde 21 de janeiro, o país apresenta média de mais de mil mortes provocadas pela covid-19. Isso significa 34 dias consecutivos. Este é o período mais longo no qual o país registra média diária acima de mil mortes pela doença causada por coronavírus. Até então, a marca anterior era de 31 dias, entre 3 de julho e 2 de agosto de 2020.

— Além de os dados já apontarem para uma piora com relação ao momento mais crítico de 2020, a tendência é de aumento dos índices epidemiológicos. Existe o temor da circulação de novas cepas, mais agressivas e que com maior capacidade de disseminação — avalia Wallace Casaca, matemático da Unesp e um dos responsáveis pela plataforma SP Covid-19 Info Tracker, que projeta infecções, óbitos e recuperados em São Paulo.

As variantes representam um novo desafio. Segundo o Ministério da Saúde, o Brasil já identificou novas cepas em exames de 204 pacientes. São 20 casos da variante do Reino Unido e 184 da brasileira, originada no Amazonas. Não há casos confirmados de infectados com a variante da África do Sul. O levantamento foi feito pela Secretaria de Vigilância em Saúde a partir das notificações recebidas pelas secretarias estaduais da saúde. Os dados foram contabilizados até 20 de fevereiro.

Quando o país atingiu 100 mil mortos, em 8 de agosto do ano passado, a média móvel de vítimas indicava um início de queda. Parecia que a situação começaria a melhorar. Cidades e Estados flexibilizaram restrições à circulação, e muitos hospitais de campanha foram desmontados. No mês de outubro, na marca dos 150 mil, o cenário era semelhante. O Brasil ultrapassou a marca num momento em que o pico da doença estava em queda havia um mês e meio.

O ritmo de redução, porém, era lento. Ao contrário da Europa, que teve claramente uma primeira e uma segunda ondas, o número de novas infecções e óbitos nunca arrefeceu no Brasil. Hoje, a curva de casos e mortes continua ascendente.

A gravidade espelhada pelos dados estatísticos ganha contornos reais nos quatro cantos do país. Nos primeiros 54 dias do ano no Amazonas, o número de mortes por covid-19 já ultrapassou o total do ano passado. A marca foi alcançada na última terça-feira (23), com 5.288 mortes só neste ano (parte delas ocorreu no ano passado e foi diagnosticada após investigação). De março a dezembro de 2020, foram registrados 5.285 óbitos.

Em São Paulo, pelo terceiro dia seguido houve recorde de internações em UTI. Atualmente, 6.657 pacientes com suspeita ou confirmação da doença ocupam um leito de atenção intensiva no Estado. O coordenador do Centro de Contingência Contra a Covid-19, o médico Paulo Menezes, descreveu o cenário como "bastante preocupante". Segundo ele, se a tendência atual se mantiver, o Estado poderá ter um esgotamento de leitos de UTI em três semanas.

No Rio Grande do Sul, as UTIs dos cinco maiores hospitais de Porto Alegre não têm mais vagas. São eles: Moinhos de Vento, Mãe de Deus, Ernesto Dornelles, Independência e Restinga. Segundo a prefeitura, 84 pacientes esperam por leitos. É o maior número desde o início da pandemia. Nos 299 hospitais do Estado, o porcentual de ocupação de vagas nas UTIs é de 87%, o maior já registrado desde o começo da pandemia.

Números tão expressivos, como o de 250 mil mortos, deixam ensinamentos. Ou indicam que as lições não foram aprendidas. Para a microbiologista Natália Pasternak, os números mostram que o Brasil aprendeu pouco durante um ano de enfrentamento à pandemia.

— Enquanto o mundo inteiro juntou conhecimento sobre o vírus e a transmissão da doença, estamos num ritmo de transmissão acelerado. Grande parte da população nega a gravidade da pandemia e a própria pandemia. Aglomerações em bares, restaurantes e festas oferecem condições propícias para o vírus se espalhar ainda mais. Esses 250 mil mortos são um símbolo da nossa incapacidade de gerir a pandemia no Brasil. A gente aprendeu muito pouco em um ano — afirma a presidente do Instituto Questão de Ciência (IQC).

O sentimento é compartilhado por Carlos Lula, presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass).

— Essa marca significou o coroamento do nosso fracasso no enfrentamento da pandemia no país. Diferentemente de outros países, a gente não tem o comando central do país para tentar uma guinada no tratamento da doença. A gente continua na mesma caminhada e, por isso, não temos como chegar a um lugar diferente — alerta.
 
Fonte: ESTADÃO CONTEÚDO | Gonçalo Junior | GAÚCHA ZH
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